Hipnose - Anyella – transtorno fóbico-ansioso

Dr. Júlio César de Almeida Barros Psiquiatra com 36 anos de experiência clínica e formação em  hipnoterapia individual e de grupo. Criou e inaugurou o Pronto Atendimento Psiquiátrico em 1987, desde então, adquiriu grande conhecimento e prática em emergências psiquiátricas.

1ª sessão

Primeira crise,  Anyella disse:

- Não enfrento fila, não saio sozinha, sinto muito medo e pânico. Não estou dormindo bem.

Recordou do tratamento comigo, há um ano. Submeteu-se por três meses, à psicoterapia. Uma sessão por semana, ou seja, foram doze sessões num total. Interrompeu o tratamento, por que sentiu injustiçada quando o terapeuta cobrou uma sessão em que ela não havia comparecido.

Anyella continuou:

- Agora estou passando mal. Sinto taquicardia. Fiz um grande check-up e o cardiologista não achou nada. Há dois meses estou passando mal. Não te procurei, estava com medo de você, imaginei e pensei que você não iria me atender direito. Interrompi o tratamento,  achei que você ia me tratar mal.

Regressão Dirigida (RD) - A indução transcorreu no modelo do relaxamento corporal, dos pés a cabeça.

Ao final da RD a paciente diz sentir melhor, porém com o corpo pesado.

Comentários:

Destaco o sintoma fóbico. Típico das personalidades excessivamente ansiosas. O Código Internacional de Doenças (CID 10 = F40)  estabelece como sendo transtornos fóbico-ansiosos.

A justificativa da interrupção do tratamento pelo medo do terapeuta, fundamentada racionalmente pela cobrança dos honorários é a repetição de um comportamento padrão, de natureza cognitiva. A fobia atende a um propósito inconsciente de não prosseguir, de não ir adiante, da não superação, com efeito paralisante.  A paciente expressa através da frase - ‘’ interrompi o tratamento achei que você ia me tratar mal".

Esta interrupção, a não conclusão, transmite a sensação de insegurança. Começar algo e não terminar pode ocorrer com qualquer pessoa, porém, ao se tornar hábito, ser uma característica da pessoa, perfil de personalidade, implicará na vida cotidiana inúmeros problemas, desenvolverá a insatisfação, depreciará as próprias conquistas.  A cada nova consulta, a cada nova sessão de terapia, haverá uma reclamação sobre algo, sobre alguém, na psicopatologia, este comportamento repetitivo é tipificada como poliqueixosa.

A psicoterapia transita entre o real e o simbólico, entre o abstrato e o concreto, entre o objetivo e subjetivo, entre o singular e o plural. Analisei a questão da interrupção do tratamento subjetivamente nos meandros do inconsciente na qual a paciente não consegue perceber o quanto faz mal a si mesma agindo desta maneira, exemplificado na justificativa da interrupção do tratamento por causa da cobrança dos honorários por parte do terapeuta. 

O terapeuta imputa à paciente arcar com os custos dos honorários ainda que ela ausentasse à sessão.

- Do ponto de vista prático,  há de se perguntar, como o terapeuta poderá reservar um horário em sua agenda, sem receber os honorários?

- Nesta mesma hora o terapeuta poderia estar disponibilizando o horário para atender outra pessoa, isto implica em reafirmar o que é sabido por todos os terapeutas,  o horário não é do terapeuta, o horário é do cliente.

- Noutra suposição se esta paciente chegasse no horário previamente agendado e o terapeuta estivesse atendendo outra paciente como resolver este impasse. Quem estaria com a razão. Obviamente a cliente.

 

2ª sessão

Anyella  inicia a sessão falando suas dúvidas sobre os efeitos dos medicamentos prescritos, Fluoxetina e Olcadil:

- Não tomei a dose certa por causa dos prováveis efeitos colaterais que li na bula. Na bula está escrito que os remédios provocam problemas cardíacos. Também tenho medo do remédio me deixar dependente.

- Há uma diferença entre sedativos, ansiolíticos, hipnóticos e antidepressivos. A Fluoxetina é um bom medicamento para a síndrome do pânico. Em determinado momento do tratamento são necessárias doses maiores, e na fase de melhora haverá a diminuição da dose. Como as crises de pânico são recorrentes, o recomendado seria que você pudesse utilizar 40 mg de fluoxetina ao dia.

- Comecei passar mal, e não tive coragem de te procurar. Fiquei chateada com você. Vi você no parque de diversões e me escondi de você. Meu marido reprovou ‘’você não pode esconder dele, você está passando mal e esta semana tem que procurá-lo". Em seguida, sugeri que a paciente se acomodasse na cadeira e fechasse os olhos e induzi o transe. Regressão dirigida (RD):

- Imagine que você esteja neste parque de diversões. Imagine que você é uma criança, por volta dos quatro, cinco ou seis anos de idade. Chamaremos esta menina de Aninha, seria mais ou menos assim. Você é Anyelle está com a Aninha, brincando no carrossel, depois no minhocão, o pula-pula. Depois, caminham um pouco mais, saboreia algodão doce, maçã do amor. Vocês duas estão bem à vontade, com os pés descalços. Brincando na areia, na poeira. Agora... vou deixar vocês a sós. Você e a Aninha, vocês duas. O parque é de vocês. Daqui a pouco volto a encontrar com vocês... (silêncio). Encontrei com vocês novamente, e você Anyella está toda satisfeita e feliz. Daqui a pouco você vai voltar, e pouco a pouco, respire fundo, três vezes pode ir abrindo os olhos, trazendo-se de volta no aqui e agora.

- Nossa! Que bom! Fui à roda gigante, mas tenho muito medo de roda gigante.

- Mas eu não te coloquei na roda gigante.

- É! Mas eu fui por minha conta, para ver se eu quebro este medo da roda gigante. Dei muitas voltas, sozinha. Engraçado o meu filho me perguntou porque somente eu não andava com ele nos brinquedos. Os outros meninos andavam com as mães deles. Estou sentindo muito pesada, parece que estou fora de mim. Parece que cresci. Quando respiro fundo o peso e a sensação desaparece, parece que fico cheia. Respiro fundo e desaparece.

- aceite de bom grado, todas estas sensações, lhe será muito útil proveitoso. Na próxima semana continuaremos.

Comentários:

Às vezes é necessário explicar a paciente sobre os efeitos terapêuticos e os efeitos colaterais dos medicamentos. É natural que os pacientes queiram informar-se sobre o porquê e a finalidade dos remédios. No caso dos psicotrópicos a curiosidade é maior.

Há muito preconceito e informações equivocadas. A polêmica maior é sobre o risco dos medicamentos provocarem dependência química. Aqueles medicamentos que para serem prescritos necessitam de receita azul, são fármacos dependentes.

Umas das tarefas do terapeuta é o esclarecimento. Explicar no sentido de esclarecer, diminuir dúvidas, possibilitar certezas. Terapeuta agindo no sentido de mostrar uma proposição verdadeira.

Diferenciar a necessidade da dependência. Exemplificando, o diabético necessita da insulina, mas é comum ouvirmos alguém falar, o diabético depende da insulina. O mais adequado é dizer o diabético necessita da insulina reguladora e estabilizadora da glicemia. O fumante não dependente do cigarro para viver ou sobreviver, mas o hábito é pelo prazer de fumar, inalando, aspirando a nicotina o fumante vicia, se torna dependente do tabaco. É uma escolha, uma opção que lhe torna dependente, mas o cigarro não é necessário, ao contrário é totalmente dispensável, a insulina para o diabético é uma prescrição médica indispensável.

No caso da Anyelle o medo dos remédios se assemelha a todos os outros medos. O medo do psiquiatra, o medo da roda gigante, o medo de se sentir bem.

A indução do transe trouxe uma revelação espontânea do inconsciente quando ela disse ‘’fui à roda gigante e fui por minha conta’’. Este é o cerne, o núcleo da fobia da paciente, a ambivalência, ora segura e decidida e ora dominada pela insegurança e indecisões, inibindo suas capacidades, que provocam o sofrimento mental, angústia e somatização Efeito paralisante e interrupção de projetos e propósitos.  A sensação de prazer, satisfação é efêmera, prevalece a introjeção do mal estar e por efeito colateral contagia todos ao redor.

Esta é a questão ela terá de assumir que pode dar conta de muitas coisas boas na vida dela. A hipnose permitiu a elaboração dos conteúdos conflitivos subjacente, encobertos, inconscientes. O terapeuta ao sugerir que ela fechasse os olhos, imaginasse, visualizasse o parque de diversão, as personagens Anyelle e Aninha, submergiu do inconsciente a ideia de ir para a roda gigante. A roda gigante simbolizou a coragem e a autonomia.

Para a indução do transe o terapeuta utilizou o material que ela trouxe. Foi à paciente que falou de parque de diversões.  A técnica de utilização quase sempre é mais palatável com resultados comprovados.

Dr. Júlio César de Almeida Barros
Psiquiatra com 36 anos de experiência clínica e formação em  hipnoterapia individual e de grupo.
Criou e inaugurou o Pronto Atendimento Psiquiátrico em 1987, desde então, adquiriu grande conhecimento e prática em emergências psiquiátricas.

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